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Criar novas formas de participação: desafio na pauta da ArenaNETmundial

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O secretário-geral de Governo, Vinícius Wu, relatou a experiência do Gabinete Digital - Foto: Eduardo Aigner

Como incorporar a distribuição de poder, a diversidade e as novas tecnologias de informação, articulação, criação e produção nos processos de participação social – essa foi a principal questão levantada por todos os participantes do diálogo “Novas formas de participação social em rede”, dentro das atividades da ArenaNETmundial. A mesa foi mediada pelo Secretario de Serviços do Município de São Paulo, Simão Pedro.

Participaram o Ministro Chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, Gilberto de Carvalho; o coordenador do Gabinete Digital do Rio Grande do Sul, Vinicius Wu; a integrante dos coletivos Transparência Hacker e Ônibus Hacker, Daniela Silva; o representante da Casa de Cultura Digital, Rodrigo Savazoni; o membro do coletivo Hacktivistas.net e diretor do projeto FLOK Society, Daniel Vázquez; o embaixador da Open Knowledge Foundation, Finnur Magnusson; e o integrante do Laboratório de Governança de Nova York, Stefan Verhulst.

Antes de falar sobre o Gabinete Digital, Vinicius Wu trouxe uma contextualização oportuna para o desenvolvimento do diálogo, ao apresentar o Capitalismo Cognitivo como um dos pilares desse novo momento. Quando o conhecimento se torna a principal forma de construção de valor, estruturas que dependem de monopólio, sigilo e outras formas de concentração do conhecimento se tornam obsoletas e frágeis. Na sequencia, exibiu um vídeo sobre a atuação do Gabinete Digital durante as manifestações de junho que aconteceram em Porto Alegre em 2013.

Para mostrar a potência de encontros virtuosos entre a sociedade civil e governos, Rodrigo Savazoni, preferiu narrar duas histórias. A primeira foi sobre o Marco Civil da Internet, do surgimento durante um evento de Software Livre como alternativa a uma ameaça de crimizaliação da Internet por parte do então senador Eduardo Azeredo, até a aprovação de ontem (22), pelo Senado. Em sua análise, houveram duas mudanças no vetor político. Uma na mudança do Governo, quando Lula passa a presidência para Dilma Rousseff e o Projeto de Lei fica paralisado por anos. Outra quando Snowden revela esquemas de vigilância e a vontade política é retomada. Durante todo esse período, a sociedade civil se manteve mobilizada, aproveitando para aprovar quase que por unanimidade um Projeto de Lei ousado, que trabalha com um assunto complexo e que vai na contramão do que todo o resto do mundo está propondo.

A segunda aconteceu na mesma sala onde essa diálogo acontecia. Trata-se do evento “Existe Diálogo em SP”, realizado na posse do Secretário da Cultura do Município de São Paulo, Juca Ferreira. O encontro absorveu a dinãmica das redes, que no período da eleição realizou duas ocupações pacíficas e festivas do espaço público: Amor Sim, Russomano Não – contra a candidatura de Celso Russomano – e Existe Amor em SP – por uma outra forma de construção política e debate eleitoral. “Reunindo mais de 800 pessoas para discutir políticas culturais e mais de 2000 pessoas estavam acompanhando pela Internet. Um programa que respondia a cidadania com a mesma moeda da cidadania. Que vai além dos conselhos, das audiencias, das formas já conhecidas de participação. O governo reconheceu a forma como a rede elabora sua politica e foi até ela”, destaca
Essa forma como as redes elaboram seus processos e levam isso para os Governos, foi aprofundada pela ativistaDaniela Silva. Por meio de uma comparação entre a reforma da Lei de Direitos Autorais e o Marco Civil da Internet, ela mostrou o quanto a diferença entre as plataformas utilizadas para discussão de ambos foi fundamental para a evolução do processo do Marco Civil e paralisação do processo de reforma da Lei de Direito Autoral, que foi feita por meio da lógica de enquetes. “Sistemas técnicos determinam processos políticos. A rede é um ambiente que desconcentra poder. E a política é onde se concentra poder”, disse.

Em relação ao Marco Civil, ressaltou o quanto os ciclos de transparência e opacidade variavam. Tudo estava público enquanto estava nas mãos da sociedade civil. No momento em que entrou na agenda do governo, em muitos momentos nem o texto final que ia para votação a sociedade civil tinha conhecimento. E foi aplaudida ao expor mais deficiências do projeto em meio a comemorações: “Acho muito simbólico e importante abaixar o volume da comemoração e saber que enquanto a gente está conversando aqui o Coletivo Saravá, que oferece serviços livres para ativistas, esta recebendo um monte de ameaças do Ministério Público para entregar suas informações. Tem gente que vai ser presa, por causa de militância. A gente até tem um governo que olha para a Internet com esse olhar progressista. Mas a gente não tem um Estado progressista. A gente aprovou o Marco Civil com guarda de logs (dados pessoais de navegação). E ele regula muito pouco o poder que o Estado olha para os nossos dados. A gente tem um projeto de dados pessoais que também vive o momento da caixa preta”.

Entre as experiências de abertura e participação, Finnur Magnusson entrou no debate, incorporando a experiência da elaboração de projeto para a Constituição da Islândia em 2008, uma referência sempre que se fala em colaboração e política. Na ocasião, em meio à crise, a população pediu a reforma do principal documento fundador do país. O primeiro passo foi a realização de um evento com mil participantes para definir o que deveria ter e como deveria ter essa nova Constituição. A partir disso, um conselho com representantes de vários setores da sociedade foi eleito e toda a discussão e definição de conteúdo era publicada semanalmente no Facebook, plataforma que concentra 90% dos cidadãos islandeses, para comentários.

“Nós inventamos nosso próprio processo e não havia nada parecido. Usamos muitas tecnologias abertas. A mídia não estava interessada e em certo ponto nós nos tornamos nosso próprio serviço de mídia. Estamos falando de uma nação pequena, mas acredito que isso pode ser feito por qualquer pais, mudando parte dos processos. A lição é: quando se está começando algo, não precisa replicar os antigos processos”.

O Laboratório de Governança de Nova York, que desenvolve, estuda e pensa ferramentas para reinventar instituições democráticas do século XXI, foi outra experiência de participação social nos modelos de rede apresentada. “Nós chegamos num nivel de maturidade como nunca tivemos antes, com alto nível de engajamento e comunicação, com uma vasta quantidade de dados disponíveis e a possibilidade de gerar novos no intuito de repensar instituições”, argumenta Stefan Verhulst, integrante do Laboratório.

Stefan apresentou seis mudanças com a qual estão trabalhando: 1) Colaboração no lugar de Deliberação, com o desenvolvimento de plataformas de co-criação que permitem a solução coletiva de problemas complexos e a identificação por parte do Governo de quem se interessa e conhece determinados assuntos para que esse grupo possa participar da solução. 2) Descentralização no lugar da centralização, o que permite a aplicação de diversas soluções e não de uma grande solução em escala. 3) Abertura no lugar do fechamento, com base na máxima de que dados precisam estar disponíveis para os cidadãos. 4) Política pública com base em informação e conhecimento e não de fé. Para ele, grande parte das soluções não partem de uma experiência de prototipagem, o que aumenta a quantidade de erros graves. 5) Buscar soluções múltiplas ao invés de soluções únicas. 6) Governo como plataforma ao invés de governo como prestador e intermediário de serviços, o que permite a participação em todas as etapas do processo.

O diálogo encerrou com o Ministro Chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, Gilberto de Carvalho. Logo após salientar a importância do próprio ArenaNETmundial nesse processo de construção de novas formas de participação social, ressaltou que a questão não envolve apenas ferramentas ou processos, mas também uma mudança em todo o conteúdo da democracia como conhecemos hoje – o que significa romper barreiras cuidadosamente mantidas contra a transformação.

“Agora conseguimos aprovar o marco civil e estamos para aprovar o marco regulatório das relações entre a sociedade civil e estado, que está no Senado. Estamos construindo um sistema nacional de participação. Nós temos que nos orgulhar, mas ao mesmo tempo há uma consciência de que tudo isso é pouco, não é suficiente. Estamos no limiar de um novo modelo e de novos passos que devem ser dados. Quem vive a experiência de Estado sabe dos limites que voces colocaram”, referindo-se à fala da ativista Daniela Silva.

Com franqueza, Gilberto de Carvalho pediu para fechar sua fala: “Essa nova construção vai exigir igual ou maior emprenho do que a geração passada enfrentou durante a ditadura. Vai precisar de luta, porque aqueles que detêm o poder não estão dispostos a abrir mão dele. Cada passo vai precisar de muita luta, tão generosa quanto foi a luta por nossa democracia. Hoje o diálogo se tornou mais fácil e mais simples. Ponhamos a mão na massa, não façamos do Marco Civil uma comemoração, façamos do Marco Civil uma entrega generosa e sem limites para a transformação do Estado brasileiro”.

Texto: Lívia Ascava

Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão